O governo acreditou que, ao se aliar ao Centrão, conseguiria decolar a agenda reformista, mas pouco avançou. As reformas tributária e administrativa, por exemplo, ficaram pelo caminho, assim como o processo de privatização dos Correios, projeto de grande interesse da equipe econômica e do ministro Paulo Guedes, em especial. Outra Proposta de Emenda Constitucional (PEC) defendida pelo Congresso, a Reforma no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) também não deve ser votada em 2022.
Mesmo que tais propostas interessem à base do governo ou setores do Centrão aliados a Bolsonaro, a pauta reformista deve ser freada por causa das eleições, bem como outras mudanças legislativas que poderiam causar grande impacto na economia. Em anos eleitorais, pautas duras e consideradas polêmicas tendem a ser evitadas em razão do impacto direto que elas podem ter durante a campanha, refletindo no resultado do pleito, seja na disputa para vagas para o parlamento, seja na corrida rumo ao Palácio do Planalto.
Entre as PECs pretendidas, a que possui mais chance de ganhar algum avanço é a reforma tributária ampla (PEC 110/2019). Isso porque, no Senado Federal, há intenção de tocar a pauta adiante, mesmo que seja somente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ); embora a meta seja chegar até a aprovação pelo Plenário do Senado.
Outro ponto que pode favorecer a reforma, é o fato de a pauta ser de interesse do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O presidente da Comissão de Constituição de Justiça, Davi Alcolumbre, fez uma promessa de que a pauta seria prioridade no colegiado no calendário Legislativo deste ano.
O primeiro vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), também tem interesse em tocar a reforma. O senador paraibano disse que “não há dúvidas” de que a alteração seria importante para o Brasil, mas comentou a dificuldade da pauta tramitar até o final.
”Há alguma dúvida de que a reforma tributária seria a mais importante de todas as que poderiam ser produzidas? Não há dúvida! Mas, aí, você fica postergando, dificultando. No ano eleitoral, espero que todos os agentes políticos envolvidos possam fazer essa separação. Este é o meu mais profundo desejo. Mas, recorrentemente, o que nós observamos é que a própria disputa legitimamente suscita uma interferência, que não é das melhores”, pondera.
O vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (sem partido), também compreende que a reforma nos tributos seria importante para o crescimento do país, mas entende que a proposta ainda não está madura o suficiente. Outro ponto destacado pelo vice-presidente do Congresso Nacional é que, segundo ele, o presidente Jair Bolsonaro (PL), não é favorável à reforma administrativa. De acordo com ele, o Brasil vendeu a crise aos investidores, mas não aproveitou o momento certo para aprovar as reformas.
“O problema é que não existe reforma. O Bolsonaro é contra a reforma administrativa. E a reforma tributária não existe. Estamos aqui, né? Querer votar não faz diferença. Não tem o que votar. Acredito que as pautas que devem ser votadas são pautas secundárias”, afirmou. ”O problema não está no Congresso. Em 2019, o ambiente era reformista, as pessoas iam às ruas pedir a reforma da previdência que eu tive a honra de presidir. O ideal era que aproveitássemos o ambiente para emplacar a reforma tributária e enfrentar os graves problemas do nosso sistema e sua complexidade. Temos um sistema tributário equivocado e o governo não tem proposta. Chamar aquele arremedo de mudanças no Imposto de Renda de reforma tributária é uma brincadeira”, complementou Ramos.
O deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) entende que é difícil prever a pauta de 2022, mas afirma que reformas e outras pautas estruturantes na economia não vão ser votadas.
“A pauta do ano que vem está muito indefinida. O que eu sei é que não vai ser pautada reforma. Nenhuma mudança estrutural na economia vai ser pautada porque o governo não tem mais interesse nisso e o parlamento não quer desgaste. Mas qualquer coisa fora isso é futurologia”, pontuou.
Nos bastidores do Congresso se ventila a possibilidade de o governo federal emplacar matérias populistas e de cunho eleitoreiro, como um novo aumento do Auxílio Brasil. No entanto, a falta de espaço no Orçamento é um impeditivo, e a criação de gatilhos para colocar o reajuste fora do teto de gastos faria disparar a inflação, o que, na prática, não teria um grande impacto.
Entre as pautas de interesse do governo que tramitam no Congresso, estão a privatização dos Correios, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 11/2020 que altera na alíquota do ICMS, o Projeto de Lei (PL) 3729/2004 que altera regras de licenciamento ambiental, o PL 2.401/2019, para regulamentar o estudo em casa (homeschooling), o 2.646/2020, que propõe a criação de debêntures para infraestrutura e o PL 2.633/2020 para a regulação fundiária. Entretanto, segundo interlocutores do Congresso, a maioria das pautas não devem concluir suas tramitações.
O líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), foi mais um parlamentar a questionar a intenção do governo em votar reformas. Segundo ele, Bolsonaro perdeu o controle da economia e se viu obrigado a governar apenas para seus nichos. Segundo o vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, encerrada no fim de outubro, o governo está fadado ao fracasso.
“O governo não trata reformas. Eu acharia de bom tom se tratasse a reforma tributária, mas o governo não trata a reforma como prioridade. Governo fadado ao fracasso deixa de governar para os brasileiros para governar para seu nicho. A essa altura qual seria a prioridade do governo no fim de ano? Deveria ser aprovar reformas, mas tentou aprovar o projeto dos CACS (sigla para Colecionadores, Atiradores e Caçadores), projeto que legaliza a caça de animais silvestres e a liberação de armas, como se a prioridade do Brasil fosse distribuir armas. Os brasileiros não comem revólver 38, comem feijão e arroz, que está faltando na mesa’, afirmou.
Se por um lado o governo não entregou reformas robustas e concretas ao parlamento, por outro, ele também não obteve sucesso em emplacar pautas ideológicas. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), apesar de ter consolidado a base governista — pulverizada e desarticulada antes do governo se aliar ao Centrão —, não tocou pautas de cunho ideológico. Com muito custo e arroubos de Bolsonaro, Lira pôs, em agosto, o voto impresso em plenário. Com a derrota da proposta, o chefe do Planalto seguiu fazendo campanha pela mudança no sistema de voto e foi repreendido publicamente por Arthur Lira após chegar ao limite durante os atos de 7 de setembro.
Segundo Randolfe , isso acontece porque o Centrão, sobretudo Arthur Lira, são os verdadeiros responsáveis por comandar o governo. Por meio das emendas de relator, executadas a partir do Orçamento Secreto, os parlamentares que compõem o grupo marcado pelo fisiologismo detém controle determinante sobre o Orçamento, sem a transparência necessária.
Com informações do Correio Braziliense