Ney Lopes – jornalista, ex-deputado federal e advogado – [email protected] – blogdoneylopes.com.br
O julgamento do STF, que permitiu a “liberdade provisória” do ex-presidente Lula, agita a política nacional e enseja várias análises.
Percebe-se que “Lula livre”, não é a mesma coisa de “Lula inocente”. O sebastianismo e a euforia do PT poderão sucumbir ao “abraço de afogados”, na medida que surjam outras condenações e o seu retorno à prisão.
Até hoje, o PT não conseguiu apresentar à nação um projeto. Limitou-se ao “Lula livre”, na tentativa de negar os seis procedimentos penais em curso. Nessas circunstâncias, se não for provada a inocência do ex-presidente, o “tiro sairá pela culatra”, em consequência de Lula ter se transformado em samba de uma nota só.
A volta do ex-presidente em 2019 surpreendeu até alguns correligionários pela truculência verbal e o “tom” radical. “Mordeu e assoprou” ao investir contra o Presidente, Moro, o MP e a Rede Globo.
Ao mesmo tempo, rodopiou ao proclamar não ter ódio e aplaudir Maduro, Morales e Cristina Kirchner. Faltou serenidade e moderação, sobretudo quando acusou Bolsonaro de arrumar um “jeito” de não trabalhar, ao fazer o serviço militar. Feriu de graças as Forças Armadas.
A grande interrogação é se o acirramento do atual cenário político favorece a ressurreição da polarização política de 2018. Os seguidores do Presidente acreditam que sim, com o retorno dos dissidentes, diante do risco “ruim com Bolsonaro, pior com Lula”.
A eleição de 2020 será bom termômetro, a depender das coalizões formadas. Como reagirá o eleitorado centrista, que não se vincula ao PT, nem ao governo?
Um dado merece avaliação. Em que medida a política econômica do governo irá influenciar as urnas de 2020 e 2022? A economia vai bem, porém o governo combate as “corporações” e, ao mesmo tempo, atende plenamente às corporações do mercado, que até agora não sofreram cotas de sacrifícios na crise.
Trata-se de uma realidade estranha ao perfil do ex-deputado Bolsonaro, sensível aos assalariados e a classe média, o que aliás é característica dos militares.
Hoje, o seu governo envia “pacote” de reforma administrativa, que “corta” reajustes do salário mínimo, dos benefícios da previdência, reduz o salário real dos servidores (nem reajuste pela inflação), cortes de vencimentos, eliminação de serviços públicos, cobra previdência do seguro-desemprego e alcança gastos de saúde e educação.
Enquanto isso, os favores fiscais permanecem intocáveis para serem, possivelmente, revisados em 2026. A concentração de renda caracteriza verdadeira “rua de mão única”.
O inquietante é a proposta econômica do PT. Nitidamente maniqueísta aponta o “mau” e defende o “bem”, através da política de inclusão social pelo consumo.
Essa estratégia já levou o país ao “buraco”, pelo esbanjamento, corrupção e absoluta ausência das reformas sensatas e “graduais”.
Tantas turbulências políticas lembram o filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, onde o professor John Keating ensina aos seus alunos que “Existe um tempo para ousadia e um tempo para cautela”.
Concorde-se ou não com a decisão do STF, o momento nacional é de “pé no chão”. Como diz o editorial do “Estado”, “a hora é de serenidade e de convicções democráticas firmes por parte dos brasileiros que não perderam o juízo”.
Se a lei vigente não atende ao clamor popular, o único caminho será mudá-la na instância correta, que é o Congresso Nacional.
Cabe chamar atenção para o risco de no futuro, o STF declarar a inconstitucionalidade, caso se faça essa mudança com lesão ao princípio da presunção de inocência. O artigo 5°, inciso LVII, da Constituição é “clausula pétrea” (dispositivo imutável, salvo por uma Constituinte), por versar sobre os direitos e garantias individuais.
Como tal está “blindado” pelo artigo 60, IV, que impede alterações, através de emenda. Para evitar a impunidade, a via correta seria o legislador, ao invés de emendar a Constituição, inserir novas “exceções” ao artigo 283 do CPP, tais como, restringir as hipóteses de interposição de recurso extraordinário ao STF e a interrupção da prescrição de processos com recursos pendentes de julgamento, em tribunais superiores.
O STF já julgou constitucional o artigo 283 do CPP e legitimou as “exceções” de prisões, antes do trânsito em julgado, nos casos de flagrante delito e preventiva. Logo, “novas” exceções introduzidas no CPP seriam igualmente constitucionais.
Nesse clima de incertezas, o bolsonarismo ganha folego para retomar o discurso radical e moralizador. Em tese abre-se espaço político para alternativas de “centro”.
O grande problema é que faltam lideranças.
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