A exigência do passaporte vacinal para ingresso em shoppings, bares, restaurantes e locais fechados no Rio Grande do Norte fez a procura pela primeira dose da vacina contra a covid-19 disparar. Segundo dados obtidos pela TRIBUNA DO NORTE junto ao RN + Vacina, a procura pela D1 uma semana após o anúncio do passaporte vacinal aumentou 347%. Em números absolutos, 19.005 D1s foram aplicadas a partir do dia 18 de janeiro, data em que o Governo do Estado publicou o decreto com a norma. Uma semana antes, do dia 11 ao dia 17, a soma tinha sido de 4.247 doses.
Os números obtidos pela reportagem indicam que, em janeiro, foram aplicadas 26.726 D1s no Estado. Dessas, 19.005 foram aplicadas após o anúncio do passaporte, o que corresponde a 71% do total.
Nos postos de saúde de Natal, são vários os relatos de profissionais de saúde sobre pessoas procurando a primeira dose da vacina. Na maioria dos casos, os usuários alegam a exigência do passaporte vacinal como justificativa para a acessar o imunizante.
“Pessoas bem mais velhas, com 40,50 anos, vindo tomar agora pela primeira vez. Acredito que seja pelo momento da covid, que aumentou muitos casos. Esse passaporte talvez também possa ser um dos fatores, porque só entra em alguns lugares se tiver com a vacina em dia. Tem idosos de 60, 65 anos que procuram agora. E tem pessoas com D2 atrasada há seis meses”, relata a enfermeira Maria José Cordeiro, da Unidade Básica de Saúde do Planalto, zona Sul de Natal.
Para a coordenadora de Vigilância da Secretaria de Estado da Saúde Pública do RN (Sesap), Kelly Lima, o passaporte vacinal está surtindo efeito uma vez que a Saúde está conseguindo alcançar o público até então resistente à vacina.
“Chegamos, aqui no Estado, a ter mais de 85% da população iniciando a vacinação nesse final de semana. Vínhamos sem conseguir crescer desse número de 80% para essa população e com o anúncio da exigência do passaporte, conseguimos cooptar uma população que estávamos meio que desesperados e angustiados porque não conseguíamos atingir essa população”, aponta Kelly Lima.
Quem saiu de casa para tomar a primeira dose foi o tratador de água Givelson Santos Freitas, 51 anos. Ele disse que o principal fator para tomar a vacina só agora foi a proibição para ingressar nos locais públicos.
“Só vim agora porque não senti nada, tenho uma saúde boa, fui deixando para depois, é o costume do brasileiro. Como agora as portas se fecharam, não pode mais entrar em lugares, ou toma ou toma”, disse. “Todos estão tomando e temos que tomar também”, disse.
O taxista Eribaldo Melo, 40 anos, também procurou a imunização contra a covid após se ver impedido de entrar num shopping de Natal nos últimos dias.
“Agora é obrigação né? Não pode entrar nos cantos. Tem que tomar agora. Não tomei antes porque o povo conversava besteira, dizendo que não era pra tomar. A pessoa fica com aquilo na cabeça. Mas agora vou tomar as três. E era para ter tomado antes, porque sou taxista e tenho contato com muita gente”, disse.
Nos dois casos citados, a vacinação está disponível desde maio de 2021 (população acima de 50 anos) e julho de 2021 (pessoas acima de 40 anos).
Há muitos jovens também procurando a imunização. É o caso de Guilherme Morais, 17 anos, que foi se vacinar na UBS São João para poder ingressar no curso profissionalizante, que exige o passaporte. “Não estava me sentindo bem para tomar antes, receio de tomar, sentir alguma coisa, até mesmo morrer. Estou tomando mais por obrigação, porque as aulas vão começar e estavam pedindo”, disse.
Bate papo com Leonardo Lima
Biomédico, Doutor em Imunologia, pesquisador do LAIS
Tivemos um crescimento de 347% na procura pela primeira dose após a exigência do passaporte Vacinal. É possível fazer uma correlação sobre esses dois fatores?
É evidente que a exigência do passaporte fez com que tivéssemos uma demanda maior pelas vacinas de primeira dose, porque ainda existia uma parcela da população que não havia tomado a vacina, por diversas razões, políticas, ideológicas, ou questões de desconfiança nas vacinas. Ao contrário da maior população do RN, em que já temos mais de 90% acima de 18 anos com pelo menos uma dose. Então esse tipo de estímulo que os governos devem promover é fundamental para que consigamos reduzir a velocidade de transmissão do vírus. Já está claro, para todo mundo, um ano depois do início da vacinação, que as vacinas são seguras, têm contribuído para salvar milhares de vida ao longo do enfrentamento da pandemia. Hoje, principalmente quando enfrentamos uma alta de novos casos, felizmente essa alta não tem sido acompanhada em número de mortes em elevação. Observamos que as pessoas continuam se infectando, mas são casos, em sua maioria leves e que não precisam de internação e os que se internam, felizmente não morrem.
Por quais razões as pessoas insistem em não se vacinar?
A gente lembra o que aconteceu nos meses do ano passado, quando chegamos a ter 40, quase 50 óbitos por dia. Então as vacinas têm papel fundamental nesse sentido. Nesse momento, como não resta mais dúvidas, mesmo da pessoa que adotou postura de desconfiança e está observando os resultados na prática, a gente já sabe que o que tem feito com que a variante ômicron não tenha causado mortes no Estado é a vacinação. Não são medicamentos que achávamos que iria funcionar no começo. E nesse sentido, ainda hoje, a divergência na comunicação, em passar uma mensagem clara para a população, é o que faz com que as pessoas desconfiem da vacina. As pessoas que já tomaram a primeira, segunda e terceira, elas fizeram e estão fazendo seu papel social na pandemia. Mas é preciso que o Governo do Estado e os municípios façam sua parte e protejam a população exigindo o passaporte da vacinação. É uma medida simples e que poderia ter sido adotada antes e que já fez com que o número de pessoas vacinada aumentasse significativamente. Essa divergência entre decretos gera uma confusão na mensagem e um desserviço na prática, porque só quando a maior parte da população estiver vacinada, vamos reduzir significativamente a transmissão do vírus e estaremos seguros.
Com informações da Tribuna do Norte