Ney Lopes – jornalista, ex-deputado federal e advogado – [email protected] – blogdoneylopes.com.br
O maior exemplo de promiscuidade do nosso sistema político-partidário é a “camisa de força” em que se encontra o presidente Bolsonaro e aliados, todos submetidos a “mão de ferro” do “dono” do PSL, deputado Luciano Bivar.
As “cúpulas” (proprietários privados da legenda) praticam, a luz do meio dia, o “jogo sujo” de preterir e excluir os “não abençoados”. Indaga-se sobre a possibilidade de recurso à justiça. Infelizmente, o princípio da “autonomia partidária” considera essas preterições “atos interna corporis” e como tal isentos de apreciação judicial.
Com raras exceções, agem dessa forma os 35 partidos políticos em funcionamento. Quase 80 aguardam na fila autorização do TSE.
Consolidou-se ao longo dos anos, o critério de que o político vocacionado, com boas intenções e propostas inovadoras, somente poderá continuar a sua carreira, caso seja “proprietário de um partido político”. Do contrário, ficará no “meio do caminho”.
A maioria das direções partidárias pertence a “esquemas” pré-montados, visando unicamente assegurar reeleições e usufruir os bilhões do Fundo Partidário (aplicado praticamente sem fiscalização), que em 2020 poderá chegar a R$ 2,5 bilhões de reais.
Diante desse quadro, chegou a hora da tentativa de uma reforma política, o alicerce para todas as demais mudanças e ponto de partida para que se restabeleça a confiança no futuro comum. Sem ela, a nossa democracia correrá riscos permanentes.
A governabilidade depende da legitimidade dos representantes do povo e de regras estáveis no jogo democrático. Mudar a legislação vigente é inadiável e não se pode esperar mais.
Por que chega a “hora” da reforma política?
Pelo fato do Presidente Bolsonaro sentir na “própria pele” a “dificuldade” de continuar no seu partido. A alternativa, portanto, será o seu governo encaminhar ao Congresso, com a urgência possível, proposta de uma cirúrgica reforma política, eleitoral e partidária.
A realidade mostra, que a exemplo do conto de Andersen, o “rei está nu”.
O quadro partidário caótico transformou “a propriedade privada” de um partido, em dos negócios mais rentáveis do país. A fonte dos recursos financeiros disponíveis são as parcelas milionárias de dinheiro público (Fundo Eleitoral) para gastar, em benefício próprio, ou de “patotas internas”.
A mudança abrangeria muitos aspectos.
Destaco alguns.
Como se explica que no Congresso dos Estados Unidos sejam dois senadores por Estado e no Brasil três, com cerca de 70 funcionários por gabinete? Na Constituição de 1946 eram 289 parlamentares federais e hoje 513.
Nos Estados Unidos, cada deputado representa 740 mil pessoas. No Brasil, a média é de 400 mil habitantes. O Congresso terá que ser “enxugado” para reduzir despesas e aumentar a eficiência.
Outra mudança seria a inclusão no sistema eleitoral da “candidatura avulsa”. Quatro em cada 10 países permitem candidatos avulsos. Elegeram-se sem pertencer a partido político: Macron, na França; Joachim Gauck, que presidiu a Alemanha. Croácia, Bulgária e Islândia são outros exemplos de primeiro-ministro, ou presidentes, não integrantes de agremiações partidárias.
Em 37,79% dos países, as candidaturas avulsas valem até para presidente da República, como nos Estados Unidos, França, Chile, Irã e a superpopulosa Índia. Os candidatos independentes ou sem partido, não enfraquecem a democracia. Ao contrário, aperfeiçoam o sistema. Permite a presença de cidadãos descontentes com o panorama partidário.
Os “céticos de plantão”, certamente dirão que não adianta propor a reforma política, diante da recusa do Congresso.
Falso argumento.
Bobbio já destacou que as grandes mudanças começam nas “tentativas” apoiadas pelos movimentos sociais. Claro exemplo foram os movimentos sociais, que conduziram as reformas no final do século XIX. Daí nasceram o direito de voto, o sufrágio universal e o combate a graves discriminações de gênero, mudanças, que ainda hoje influem nas sociedades.
Em 2018, o próprio Presidente Bolsonaro quase foi vítima das dificuldades de encontrar uma legenda para candidatar-se.
Se ele resolver, o mais rápido possível, propor a reforma política, que falta ao país, o seu governo estará consagrado como aquele que decretou a libertação das atuais “ditaduras partidárias”.
Torna-se secundária a questão sobre se o Congresso aprovará ou não. A reforma deve ser tentada, por significar na prática, uma “lei Aurea” na política nacional.
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