Ney Lopes – jornalista, ex-deputado federal e advogado – [email protected]
Amanhã, quinta feira, o STF concluirá o julgamento de três ações Declaratórias de Constitucionalidade e definirá quando uma pessoa poderá ser presa no Brasil. O placar está em 3×4 pela possibilidade de prisão, após a condenação em segunda instância.
A primeira análise é de que “o mundo não irá acabar”, qualquer que seja o resultado do julgamento. Numa democracia é normal a Corte Suprema interpretar e aplicar a Constituição.
Vem dos Estados Unidos esse sistema judicial de “controle de constitucionalidade”, cujo maior exemplo foi a chamada “Corte de Warren”, que teve intensa atuação no período de 1953/1969. À época operou-se verdadeira revolução no Direito Constitucional, com inúmeros exemplos de drásticas mudanças de interpretação, em relação a direitos fundamentais, sociais, econômicos e políticos, vigentes até hoje.
No momento brasileiro, o risco é a desinformação, fomentada por correntes radicais, que semeiam o “pânico” e pregam até o fechamento do STF, caso a decisão final não siga tal ou qual interpretação político-ideológica.
Esses comportamentos de “flerte” com o autoritarismo assemelham-se a metáfora do “ovo da serpente”, retratada no filme de Ingmar Bergman, que mostra como foi inoculada a semente do nazismo na Alemanha nos anos 1920, sob a justificativa das instituições estarem apodrecidas e ser necessária a chegada de um “salvador” a margem da lei, que surgiu com o nome de Hitler, autoritário, personalista e populista.
Afinal, em que consistirá o julgamento do STF?
Tudo começa no artigo 5º, inciso LVII, cláusula pétrea da Constituição Federal, passível de alteração somente através de instalação de Assembleia Nacional Constituinte, onde está consignado:
“LVII – ninguém será considerado culpado, até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;”
A decisão irá considerar constitucional, ou não, o artigo 283, do Código de Processo Penal, assim redigido:
“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.
Cada país aplica sistema de direitos e garantias diferentes. Naqueles em que o réu vai para a cadeia, após decisão de segundo grau, “vários” juízes decretam a sentença. Exemplo é a Alemanha.
Na França, até julgamentos de primeira instancia são realizados por “grupos” de juízes.
Nos Estados Unidos, onde as prisões ocorrem depois da primeira instância, os casos criminais têm julgamento em júri popular e cerca de 95% resolvem-se por meio de acordos.
Tratam-se de sistemas judiciais totalmente diferentes do Brasil, onde entre as décadas de 1940 e 1970, nos crimes com pena superior a 10 anos, a prisão era na apresentação da denúncia.
Quem mudou foi a Revolução de 1964, que permitiu (1973) aos condenados aguardarem em liberdade o julgamento do recurso. A medida tornou-se conhecida como “Lei Fleury” para beneficiar o delegado Sérgio Fleury, que comandou o DOPS, no período da repressão.
Na vigência da Constituição de 1988, em 2009, o STF determinou a prisão somente após o trânsito em julgado da sentença. Mudou a jurisprudência em 2016, ao prevalecer a análise das provas e dos fatos nas “duas primeiras instâncias”, permitida, em seguida, a prisão.
A matéria está sendo agora reexaminada.
Oportuno esclarecer, que as penitenciárias não serão “escancaradas”, caso rejeitado o critério vigente, desde 2016. Mesmo em tal hipótese continuaria sendo possível a “prisão”, antes da sentença transitar em julgado, através de decisão fundamentada de Juiz, ou Tribunal e preventivamente, em qualquer fase do processo (artigo 312 do CPP).
A Corte também se pronunciará acerca da “automaticidade”, que permite o efeito imediato das condenações. Até hoje, apenas dois ministros do STF são favoráveis. Se não houver a “automaticidade”, a prisão dos réus, nem será proibida, nem automática, com as decisões prolatadas caso a caso.
Justifica-se a expectativa, em torno da decisão de amanhã, do STF.
Espera-se, entretanto, que a Democracia seja considerada um valor universal e a única forma de convivência livre.
Por tais razões, não constitui demasia repetir, que é melhor um “tribunal livre” julgando, do que o arbítrio de uma “ditadura”.
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