Ney Lopes – advogado, jornalista e ex-deputado federal – [email protected]
Uma tarefa difícil do governo Jair Bolsonaro será enfrentar o “caos aéreo” brasileiro, no que diz respeito às elevadíssimas tarifas cobradas e, regra geral, os péssimos serviços.
Repetem-se casos de passageiros submetidos a toda sorte de humilhações e angústias em aeroporto, ficando sem assistência ou informação, nas ocorrências de atrasos e cancelamentos. Juridicamente, o contrato de transporte consiste em obrigação de resultado, configurando o atraso ou cancelamento manifesta prestação inadequada.
A falha no serviço de transporte aéreo contratado gera o direito à devida assistência material e informacional ao consumidor lesado, independentemente da causa originária. Na legislação vigente não importa o motivo que ocasionou o atraso ou cancelamento.
A responsabilidade é da companhia aérea e cabe a ela prover as opções de acomodação ou assistência. Mesmo no caso de problemas climáticos, a empresa área é solidária
Urgente à definição de um verdadeiro “marco regulatório”. O governo Temer cedeu em demasia às exigências das empresas. Só falta o usuário pagar “taxa extra” para ter acesso no avião, porque tudo já lhe é cobrado, sem controle e sem critérios.
E o pior: a tarifa não baixa e os serviços a bordo caíram drasticamente, até em classe executiva. O autor do artigo, por exemplo, comprou, no final de novembro, passagem no trecho ida e volta Natal-São Paulo. Por motivo superior comunicou à empresa Latam, mais de 48 horas antes do voo, que não viajaria. Na remarcação do bilhete, menos de uma semana após, houve imposição de multa, diferença de tarifas e o não reconhecimento do pagamento anterior da poltrona.
O trecho ficou por cerca de U$ 450 dólares americanos (mais de mil e setecentos reais). Recentemente, o autor fez o trajeto Orlando-Nova York, na empresa americana Jetblue, que corresponde a distancia Natal-SP. A tarifa não chegou a U$ 300 dólares (cerca de mil e cem reais), incluindo pagamento de assentos e bagagem.
Além de outras diferenças constatadas, cito o espaço das poltronas na empresa americana, que é pelo menos duas vezes superior ao avião da Latam que, no último dia primeiro, fez a viagem Natal para SP (LA 3505). Só vendo para crer o espaçamento interno das poltronas nesse voo. A empresa americana, que é de “baixo custo”, oferece gratuitamente refrigerantes, petiscos, café, chás.
No voo LA 3505 (como nos demais da empresa), somente água. Produtos vendidos a bordo por preços elevadíssimos, deixando os passageiros sem opção. Única coisa positiva, a extrema gentileza da tripulação.
O mais curioso: a Latam informa os preços de bagagem pelo telefone, cotados em dólar americano (no site é em reais). Todo o controle de voos e administração é concentrado no Chile, inclusive os aviões mais novos são usados em trechos que partem de Santiago do Chile, salvo algumas exceções, dependendo do destino final (concorrência com empresas de maior porte). Uma humilhação para o Brasil.
Recentemente, quando a ANAC consentiu na cobrança de assentos, alimentação e malas, o anuncio era de redução das tarifas. Ao contrário, subiram exorbitantemente, Nas companhias nacionais até os programas de fidelidade estão sem controle, com critérios reformulados para pior.
O novo governo anuncia propósito de baixar um decreto, já em janeiro, retirando das agencias reguladoras competências que passariam para os ministérios. A boa iniciativa deveria começar pela ANAC, onde se acumulam abusos do caos aéreo nacional.
Recentemente, o senador Jean Paul Prates (PT-RN) pediu explicações como é possível uma passagem aérea (Avianca), Natal-Brasília, ser 100% mais cara do que João Pessoa-Brasília, quando são cidades separadas por menos de 200 quilômetros.
Outro empresário Haroldo Azevedo denunciou no “twitter”, cancelamento unilateral de voo (Azul), sem aviso prévio e assistência aos passageiros, no trecho Recife-Orlando.
Na Europa, em 2017, a média de tarifa da irlandesa “Ryanair” foi de 39 euros (R$ 170). A passagem média paga por um por um voo doméstico no Brasil foi R$ 357, segundo a ANAC. Atualmente, o mercado de voos domésticos é concentrado em quatro companhias: Avianca, Azul, Gol e Latam.
As tarifas não são reguladas pelo governo, desde agosto de 2001, com o chamado regime de liberdade tarifária. Não se trata de reivindicar tabelamento, que não funciona. Mas, “nem tanto ao mar, nem tanto ao peixe”. Certamente, aqueles que idolatram o “mercado” dirão que a lei da oferta e da procura regulará tais abusos.
Pura heresia. Na pátria do capitalismo – os Estados Unidos – não é assim.
Espera-se que o novo governo enfrente com energia o caos aéreo nacional, abra à concorrência e assegure maior proteção ao usuário final.
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