POR FOLHAPRESS
Assassinatos, lesões, ameaças e ofensas fizeram destas eleições as mais violentas da história, dizem especialistas em segurança.
“É o pleito em que o tema esteve mais presente, tanto no número de agressões quanto nos discursos”, diz Renato Sérgio de Lima, 48, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
“A polarização levou pessoas a quererem impor verdades à força. Isso é ruim para todos, pois no dia seguinte teremos que conviver”, diz Elisandro Lotin de Souza, 45, sargento da Polícia Militar de Santa Catarina e presidente da Associação Nacional de Praças.
“Foi, sim, a eleição mais violenta, tanto na ideologia quanto entre eleitores. E não só desconhecidos, mas familiares, amigos”, diz Beatriz Pedreira, 32, cientista social e cofundadora do instituto Update.
Ela realça o que vê como um fator de agravamento: a recessão que precedeu o pleito. “A crise deixou as pessoas mais inseguras e fomentou medo, individualismo e violência.”
O site Vítimas da Intolerância, das ONGs Open Knowlegde Brasil, Brasil.IO e Agência Pública de jornalismo, totalizou quase 60 ocorrências ligadas às eleições, incluindo 36 homicídios e agressões.
Já a plataforma Violência Política no Brasil, dos portais Opera Mundi, Outras Palavras e De Olho nos Ruralistas, contabiliza 133 agressões por motivos políticos, incluindo oito mortes e 42 lesões corporais.
A maioria envolve ataques de apoiadores de Jair Bolsonaro (PSL) contra gays, mulheres e pessoas vestindo símbolos da esquerda, como bonés do MST ou camisetas do PT.
Houve também agressão no sentido oposto: um professor machucou a cabeça após ser agredido e cair, no centro de São Paulo, depois de gritar “Ele sim” a um grupo que protestava contra Bolsonaro.
Um dos episódios mais emblemáticos foi o do compositor e mestre de capoeira Romualdo Rosário da Costa, o Moa do Katendê, morto em Salvador (BA) a facadas.
Após ser preso, o agressor Paulo Ferreira de Santana afirmou que o ataque se deveu a divergência política, pois é eleitor de Bolsonaro, e Moa, que faria 64 anos nesta segunda (29), havia declarado voto em Fernando Haddad (PT).
Também em Salvador, um professor foi preso após tentar atropelar um homem que vendia camisas de Bolsonaro. A vítima não foi atingida.
Em Curitiba (PR), um estudante que vestia boné do MST foi agredido com garrafadas por pessoas com camisetas de torcida organizada que, segundo testemunhas, gritavam “Aqui é Bolsonaro!”.
Um dos casos de maior repercussão teve a veracidade contestada. Uma estudante de 19 anos de Porto Alegre disse que foi atacada por homens que usaram um objeto pontiagudo para marcar em sua barriga um símbolo semelhante à suástica nazista. Baseada em laudo pericial, a Polícia Civil do estado concluiu que ela se automutilou.
Por outro lado, o total de agressões pode ser maior, já que há casos não registrados.
Na sexta (26), a atriz Monica Iozzi publicou um relato em suas redes sociais sobre um amigo gay gravemente agredido por um homem que se disse apoiador de Bolsonaro.
Além disso, a contabilidade não considera ameaças verbais, como a relatada por uma analista da ONG Todos Pela Educação ameaçada de estupro na avenida Paulista, em São Paulo —com medo, ela prefere não divulgar o nome.
“Ao dizer que minorias vão ter que se submeter à maioria, Bolsonaro autoriza a extinção corporal. Enquanto mulher, me sinto ameaçada”, ela diz.
A violência atingiu a classe política. O próprio Bolsonaro foi esfaqueado em um comício em Juiz de Fora (MG), em setembro. Em março, Marielle Franco (PSOL), vereadora do Rio, foi morta a tiros —a polícia não liga o caso ao pleito, mas investiga razões políticas.
Também em março, agressores atiraram contra um ônibus que levava 26 repórteres que cobriam eventos do PT no Paraná. Ninguém ficou ferido.
Segundo Lima, do FBSP, a radicalização dos políticos fez as pessoas se sentirem autorizadas a cometer atos violentos. “Principalmente Bolsonaro, com um discurso de destruição do inimigo”, ele diz.
O acirramento atingiu a imprensa. A Abraji registrou 141 ameaças e agressões a jornalistas que cobriam as eleições.
O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, determinou que a Polícia Federal investigue ameaças a Patrícia Campos Mello, repórter da Folha, e a Mauro Paulino, diretor-executivo do Datafolha. Elas ocorreram após reportagem do jornal mostrar que empresas estavam contratando disparos em massa
anti-PT por WhatsApp.
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