A cena de um idoso morto no chão de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Teresina/PI é o retrato fiel e sem retoques, nem tão pouco photoshop, do colapso em que se encontra a saúde no Brasil, em virtude do agravamento diário da pandemia do novo corona vírus.
Se João, José ou Francisco, o fato é que o cidadão não resistiu à falta de maca e de atendimento mínimo necessário para que sua vida fosse restabelecida. Tão chocante e ao mesmo tempo tão deprimente quanto vê-lo sem vida no chão frio de unidade hospitalar é a imagem da profissional de saúde com um sentimento de derrota frente ao momento que vivera e a sensação de impotência diante do resultado de sua tentativa frustrada de salvamento.
Vivenciando recordes diários de mortes e de média diária crescente, fica a sensação de que a primeira onda foi tão somente o prenúncio de algo devastador e apocalíptico que estava por vir. O covid-19 foi devidamente apresentado de forma traumática, mas fica a amarga sensação de que não demos a devida atenção e importância que ele merecia. Especialista em mutação, o vírus mostrou que não está nem aí para a saúde, muito menos para o emprego, nem tão pouco para a miséria que ele propaga. Insensível que é aos buracos que são abertos para enterrar corpos e mais corpos, como um sinal claro do nosso menosprezo a todo o mal que ele fez e ainda vai fazer, segue seu mister em produzir cadáveres de norte a sul do país, sem fazer qualquer distinção de credo, etnia, ideologia política ou classe social.
Para esse assassino em série viral, a dignidade da pessoa humana não merece respeito. Quando um cidadão brasileiro perde essa luta desigual como o idoso do qual tratamos no início, da forma como se deu, precisamos parar e repensar muita coisa, inclusive a importância de cada uma das quase 300.000 mortes contabilizadas. Essa mesma importância menosprezada pelas festas clandestinas realizadas e aglomerações praticadas sob todas as formas.
Cruzamos uma fronteira perigosíssima quando permitimos que alguém morra sem o mínimo de dignidade, ferindo de morte um dos mais importantes princípios constitucionais. Se estamos numa guerra, todo soldado perdido é uma baixa que não será preenchida ou compensada, nunca mais.
Para a família resta dor, sofrimento, sentimento de perda e a súplica para não ser a próxima morte num piso de hospital. Infelizmente, muitas vidas ainda serão perdidas antes de podermos respirar mais tranquilos e de podermos abraçar um ente querido e que não esteja necessariamente num caixão.
Do meu ninho utilizando máscara, mantendo distanciamento social e só saindo para caçar minha próxima refeição, me filio à corrente “Vacina sim!” e o quanto antes.