Ney Lopes – jornalista, ex-deputado federal e advogado – [email protected]
O texto é escrito sem a chegada do “tsunami”, previsto pelo Presidente. Tsunamis são ondas oceânicas gigantes causadas pelo vento.
Nas democracias, os “tsunamis políticos” também têm causas. O Brasil corre esse risco. Até o próprio presidente pressente.
Quais seriam as causas?
Por melhores que sejam as “boas intenções” do governo federal, dois “gargalos” ameaçam o Planalto: desarticulação com o Congresso e “choques internos”, atingindo inclusive o núcleo militar, até agora o que demonstra mais eficiência.
Em qualquer lugar do mundo, as democracias funcionam com o poder Executivo articulado ao Legislativo para facilitar a governabilidade, com respeito às decisões do judiciário. Raciocínio contrário seria a ditadura.
Na eleição de 2018, com o país em clima de “êxtase”, o candidato vitorioso qualificou o “presidencialismo de coalizão” como “toma lá dá cá”, sinônimo de corrupção. Grave equívoco!
Existiram realmente “desvios” nos governos anteriores. Todavia devem ser apurados e punidos os culpados. A “coalizão política” como método de ação no Congresso é outra coisa. A origem está nas democracias mais tradicionais e nos fundamentos da separação dos poderes.
Já se disse que a “nova política” nada mais é do que a “velha”, sem corrupção e sem impunidade.
Embora desmentido pelo ministro Moro, o Presidente confirma o compromisso de indicá-lo para o STF. Se verdadeiro teria sido a “velha política” do “toma lá me dá cá”?
Aliás, essa indicação contraria o pacote de 70 medidas contra corrupção, sugerido pelo próprio Moro, no qual a 29ª medida proíbe a indicação ao STF, de quem tenha sido ministro de Estado, nos quatro anos anteriores, para evitar cooptação.
A questão básica do “presidencialismo de coalizão” é abrir a negociação entre executivo e legislativo, com clareza e objetividade.
O líder do partido do Presidente (PSL), Delegado Waldir, foi incisivo ao defender essa “forma de governar”. Disse ele que “não é subordinado ao Executivo. Nós não fomos convidados para a governabilidade. Então nós não participamos”.
Montesquieu na formação do Estado Liberal vinculou a “coalizão” política ao “sistema de freios e contrapesos”. Consiste no controle do poder pelo próprio poder, ou seja, cada poder é autônomo para exercer as suas funções, porém é controlado pelos outros poderes.
Essa tripartição clássica existe até hoje nas democracias e está declarada na Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão e em nossa Constituição.
Para construir o diálogo, o governo terá que dispor de “agenda clara” (o que até hoje não teve) e montar rede de trocas institucionalizadas, como meio de atingir objetivos nacionais.
Essa forma de agir seria o inverso da estratégia usada ultimamente, que “apavora” e “amedronta” a Nação, com a repetição do anuncio de caos econômico e financeiro, na hipótese do Congresso alterar, em parte, a reforma da previdência, para corrigir certas distorções impostas pela avidez do mercado.
Outro “gargalo” são as crises internas do governo.
O “estilo” Bolsonaro e de familiares, ao invés de reduzir tensões provoca silvos de ventos fortes, aproximando “tsunamis”, quase diários.
Em análise publicada pelo “American Entreprise Institute”, Ryan Berg considera, que “Bolsonaro terá que deixar de lado o seu pugilismo e obsessões ideológicas, por tempo suficiente para resolver os problemas do Brasil”.
Como se não bastasse, até os ministros sopram ventos uivantes. É o caso do ministro Paulo Guedes com a inoportuna declaração, ameaçadora para o Congresso, de que a reforma da previdência “é tudo nada”.
Trocando em miúdos, ele quis dizer que não há margem de negociação. A verdade única é a dele e ponto final.
Alias, embora exista no poder um governo conservador de direita, o estilo usado tem sido de incentivo à “luta de classes” (concepção marxista), ao confrontar pobres contra ricos, no combate a supostos privilégios na Previdência.
Onde estão os critérios do bom senso e da razoabilidade?
A única coisa que se impõe no futuro será o governo mostrar claramente os verdadeiros “privilégios” do Brasil, na sua anunciada campanha publicitária de convencimento.
Não necessita muito esforço para identificá-los.
O editorial do “Estado” já recomendou: “Não é impossível fazer boa política. Quem quer faz”.