Artigo Ney Lopes: “A hora do diálogo nacional: “todos” numa mesa”
Ney Lopes – jornalista, ex-deputado federal e advogado – [email protected] – blogdoneylopes.com.br
As democracias ocidentais atravessam grave crise. A representação popular está cada vez mais distante das aspirações sociais.
O Brasil não é exceção.
A eleição de boa parte do Congresso Nacional, por exemplo, resultou da “onda Bolsonaro”, traduzida na maciça rejeição popular ao PT e o discurso antiviolência do candidato. A consequência foram candidatos vitoriosos, sem experiência e vivencia política.
Neste cenário colocam-se os “partidos cartéis”, organizações artificiais, com métodos de gestão privada-familiar, nutridos pelo dinheiro público em abundância. A cada eleição aprova-se uma lei eleitoral, sempre pior do que a anterior.
A legislação é “fatiada” para atender as “reeleições”. O pior é que não se fala numa ampla reforma política, partidária e eleitoral, tão importante para a estabilidade nacional, quanto à da previdência.
Como a “dor ensina a gemer”, mesmo diante desse cenário de descrença, nunca é demais insistir na possibilidade de um “pacto político”, que começaria pelo governo convocar “todos” (inclusive a oposição) para sentarem-se à mesa, em torno dos interesses legítimos (e não manipulados) da Nação.
Em regime de urgência, uma pauta poderia identificar as “reformas mais urgentes”, em busca de consenso, começando pela mudança “possível” da previdência, gradual, que “divida sacrifícios” e reduza o déficit existente.
A prioridade seria definir a idade-limite para a aposentadoria, sem o que não se pode falar em reforma previdenciária. Caso a redução de gastos não seja suficiente, outros “ajustes econômicos” complementariam as mudanças.
Talvez, a convocação de uma “constituinte originária” se coloque, em médio prazo, como urgência nacional.
A Nação seria sensível ao diálogo suprapartidário. O que não adiantará, com certeza, é rotular como “pressões corporativas”, todos aqueles que “ponderem” alterações na proposta previdenciária do governo.
Esse discurso omite que a grande pressão atual nasce da maior corporação, que é o “mercado”, altamente unido e articulado. Nos últimos dias, percebe-se de parte do governo estratégia perigosa e de “mão única”, propagando o “pavor”, o “medo”, com anúncios de caos, de atraso no pagamento de salários e aposentadorias, de volta da inflação, como meio de cooptar o Congresso, “a ferro e a fogo”.
Tudo que for aprovado nesse clima, com sacrifícios “não divididos”, criará instabilidade social e trará consequências nefastas para o país. Ninguém duvide.
Fujimori, no Peru, em 1992 elegeu-se com esmagadora maioria e proclamou um governo de emergência e reconstrução do país, em nome do combate à corrupção e a guerrilha.
A exemplo do Brasil de hoje surgiram obstáculos políticos, parlamentares e judiciais contra as reformas essencialmente “pró-mercado”, por ele ardorosamente defendidas. Fujimori insistiu, aprovou o que queria e o país “afundou de vez”. Ele terminou fugindo para o Japão.
Macri, o “novo” na Argentina, forçou medidas extremas, unicamente “pró-mercado”. O resultado é que está mergulhado em crise. Dificilmente se reelege, com inflação astronômica, desemprego crescente e crise cambial inédita.
A exemplo de Moncloa (Espanha) e Consertacíon (Chile), ainda há tempo de buscar um pacto político no Brasil, que construa os pilares da união nacional, em torno de objetivos comuns.
A mera confrontação com o passado, como meio de manter-se no poder, não levará a nada. Aumentará as tensões.
Outra consequência do possível do “pacto político” seria despertar os partidos para melhor exercerem o papel de interlocutores da Nação, em momento de crise. A propósito, Maurice Duverger, Emérito Professor da Faculdade de Direito e Ciências Econômicas de Paris, ao visitar o Brasil, antes de morrer escreveu:
“O Brasil será uma grande potência no dia em que for uma grande democracia. E só será uma grande democracia no dia em que tiver partidos e um sistema partidário forte e estruturado”.
Para aqueles que qualificam como “sonho” o pacto político e a reforma previdenciária gradual, cito o exemplo de Annie Lööf, de apenas 35 anos, na Suécia.
Ela hoje é personagem decisiva na vida pública do país. De formação conservadora resolveu assumir posições “sociais” (chamadas de centro esquerda) e vem crescendo politicamente.
O lema de Annie Lööf é inspirador: “Nenhum (sonho) é impossível, algumas coisas só demoram um pouco mais”.